Se Benjamin Netanyhau assinar o acordo de cessar-fogo desenhado no Catar com mediação dos EUA e do Egipto, contra a ruidosa oposição dos seus ministros mais radicais, Bem Gvir, da Segurança Nacional, e Bezalel Smotrich, das Finanças, o seu Governo colapsa.

Mas se não o fizer, isso vai enfurecer o Presidente-eleito dos EUA, Donald Trump, que já veio a público reivindicar os louros do sucesso conseguido no Catar, e sem o apoio de Washington, Israel ficaria muito fragilizado perante a imensa geografia adversária que é o Médio Oriente.

O documento que saiu de Doha, no Catar, esteve quase a ser assinado pelo Governo de Telavive, mas, à última da hora, Netanyhau veio dizer que o Hamas tinha feito exigências inusitadas de última hora para justificar o atraso na conclusão do processo.

No entanto, a razão não se prende com quaisquer imposições do Hamas, que veio de imediato negar qualquer inclusão de ruído no processo, mas sim com o facto dos seus ministros Ben Gvir e Smotrich o terem encostado à parede com a ameaça da demissão se assinasse o documento.

Isto, porque se os igualmente lideres do ultranacionalista de extrema-direita Partido Otzma Yehudit e o Partido Sionista Religioso, se demitirem, o Likud, de Netanyhau, que, com intermitências curtas, governa Israel desde 1996, fica sem a maioria que lhe permite governar, nesta última aparição, desde 2022, condenando-o à perda do cargo de primeiro-ministro.

E se Benjamin Netanyhau perder o cargo, que apenas conseguiu manter com cedências totais aos radicais Gvir e Smotrich, e ao conflito em Gaza, que o libertou das grandes e persistentes manifestações de rua contra si, vai ter à sua espera os tribunais de Israel onde continua acusado de graves crimes de corrupção e branqueamento de capitais que o podem levar à cadeia.

Sabendo disso, o primeiro-ministro israelita tem em cima da mesa o dramático dilema de resistir aos seus ministros radicais e assinar o acordo, ou continuar a procrastinar e terá de lidar com a fúria de Donald Trump que pode passar da condição de seu melhor amigo ao por inimigo com que já lidou.

Isso, porque basta ao americano desligar a torneira do apoio militar a Israel para conduzir o país à insustentabilidade perante a complexidade regional onde está rodeado de inimigos e adversários e mantém várias frentes activas, como, além de Gaza, com o Hezbollah no sul do Líbano, na Síria, após o colapso do regime de Bashar al-Assad, com o Houthis do Iémen e ainda o perpétuo risco de um conflito com o Irão.

Entre o desmoronamento do seu Governo e enfrentar a fúria de Donald Trump, Benjamin Netanyhau vai ter de escolher...

Para já, o ainda secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, diz acreditar que o acordo de cessar-fogo entre Israel e o Hamas para a Faixa de Gaza vai mesmo começar no Domingo.

Uma boa parte da imagem da Administração Biden, que sai de cena no Domingo, e que está na iminência de perder a guerra da Ucrânia, depende deste acordo em Gaza para ter um fim de mandato com algum alívio, o que leva o ainda Presidente dos EUA a também estar a pressionar ao máximo Netanyhau.

Enquanto isso, quando em Washington Biden e Trump se batem pelos créditos de acordo de cessar-fogo que não foi ainda fechado, e onde, mais uma vez, a União Europeia sai menorizada neste momento histórico, em Gaza Israel já matou mais de 100 pessoas desde que o emir do Catar anunciou que tinha sido alcançado um acordo, há menos de 72 horas.

São mais 100 mortos, com pelo menos 27 crianças e 31 mulheres, segundo os relatos do terreno dos repórteres da Al Jazeera, juntar aos mais de 46 mil desde 07 de Outubro de 2023, quando começou a invasão israelita do território para punir o ousado e letal assalto do Hamas ao sul de Israel, onde fez mais de 1000 mortos, na maioria soldados israelitas.

A par da mortandade, que os tribunais internacionais consideram ser um genocídio, crime pelo qual Netanyhau é procurado internacionalmente, em Gaza está quase tudo arrasado, mais de 80% dos edifícios, casas e equipamentos sociais, estão em ruínas, não há um dos 36 hospitais a funcionar sem clamorosas dificuldades...

São mais de 2,3 milhões de habitantes a viver em 365 kms2, com a fome e a doença, segundo a ONU, devido ao afunilamento da ajuda humanitária por Israel, a matar já mais que os bombardeamentos israelitas.